A vinda de Cristo ao mundo inaugura uma nova
era e uma maneira totalmente diferente do homem se relacionar com Deus, e comparada
com aquela anunciada e vivenciada ao tempo do Antigo Testamento é melhor e mais
intensa para todos.
O Novo Testamento deixa claro que a partir de
Cristo: a) as bênçãos não são mais de ordem material (chuva para multiplicar a
colheita), mas sim espiritual: abençoados
com toda sorte de bênçãos espirituais nas regiões celestiais em Cristo (Ef
1.3); as lutas não tem mais caráter literal, físico, como aquelas travadas
entre Israel e os Cananeus, por exemplo, porém espirituais: Porque não temos que lutar contra a carne e
o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os
príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos
lugares celestiais (Ef 6.12); a santificação já não mais implicará na
observância de rituais de lavar as mãos, guardar dias, festas, mas acima de
tudo em santificação do Espírito (1
Pe 1.12); ser povo de Deus não é mais questão de pertencer a uma etnia
específica, ou seja, ser judeu, ou mesmo a uma nação determinada, isto é,
Israel, mas sim pertencer a igreja de Cristo onde estão presentes povos de
todas as rações, tribos e nações alcançadas pelo evangelho que deverá pregado a
todas as nações (Mt 28.19); etc.
etc., etc.
Enfim, com o Reino de Deus inaugurado pela
ressurreição de Cristo tudo é novo e tudo que não é novo nada tem a ver com sua
proposta.
Aliás, a grande luta do apóstolo Paulo foi,
no caso das igrejas da galácia, impedir que os crentes voltassem ao tempo
antigo, à época do judaísmo, visto que desejavam deixar a realidade que é para
voltarem àquilo que não mais era.
Paulo os chama de insensatos (Gl 3.1), ou seja, de crentes sem sensatez, sem juízo,
loucos mesmo pois além de pretenderem voltar ao que não mais existia, também
estavam deixando o melhor para se darem a práticas escravizadoras.
Ainda vale ressaltar que outro ponto também
sofre modificação radical e profunda a partir de Cristo é a adoração a Deus.
Com Jesus Cristo a adoração deixa de obedecer
o ritual vétero testamentário, inclusive no que diz respeito ao lugar
específico para sua prática, e passa a um nível muito mais elevado de ser
realizada.
Vale lembrar que no tempo antigo a adoração
era feita com apresentação de animais e cereais ao Senhor (ver o caso de Caim e
Abel); com oferta de animais e cereais em altares (ver as práticas de Noé, Abraão)
e depois, já ao tempo do povo de Israel, a oferta de animais e cereais feita em
altares tinha que acontecer no templo na cidade de Jerusalém.
Quando num determinado momento da história de
Israel surgiram os samaritanos, sua adoração
ao invés de ser em Jerusalém passou a ser praticada num determinado
monte em Samaria, portanto, fora do templo.
Quando Jesus se encontra com uma mulher
samaritana junto ao poço de Sicar (Jo 4.5) da conversa entre eles fica
evidenciado o fato de que samaritanos e judeus tinham lugares diferentes para a
prática de sua adoração, pois supondo que Jesus era um profeta (Jo 4.19), a mulher não reluta em lançar uma
pergunta para resolver sua dúvida, ou seja, para definir qual o lugar certo
para se adorar a Deus.
Os samaritanos diziam que a adoração deveria
ser feita no monte, já os judeus asseguravam que ela não poderia ser realizada
senão no templo na cidade de Jerusalém.
Como Jesus estava trazendo uma nova realidade
sua resposta foi: nem no monte
em Samaria, nem no tempo em Jerusalém,
mas em espírito em verdade (Jo
4. 21-23).
Estas palavras de Jesus é que dão título a
esta reflexão: nem num
lugar, nem noutro, mas em espírito e em verdade.
A partir destas palavras Jesus está afirmando
que a adoração não estava mais presa a uma geografia específica; mesmo porque daquela
hora em diante não haveria mais altar e nem razão para se oferecer animais e
cereais a Deus, pois a adoração seria praticada noutros termos.
A adoração agora seria espiritual; a adoração seria
em todos os lugares; a adoração deveria
ocorrer em todo o tempo e o povo de Deus seria achada entre todas as nações.
A adoração seria mais um estilo de vida do que propriamente um momento da vida.
Contudo, mesmo Jesus tendo dito a mulher que nem no monte, nem em Jerusalém mas em
espírito em verdade é que os adoradores devem adorar a Deus, as práticas
modernas de adoração, tudo indica, estão de alguma forma contrariando essa
realidade.
A adoração atual proclama e conclama os crentes
a um local certo e a uma hora determinada para ali se adorar a Deus, de modo
que todos devem ir a igreja para desempenhar seu papel de adorador.
Como a ideia é que a adoração deve ser feita
na igreja, os crentes estão perdendo o privilégio de adorar a Deus em espírito
em verdade todo o tempo em qualquer lugar, preferindo fazê-lo somente num dia
certo e num lugar indicado.
De alguma forma isto representa uma volta ao
Antigo Testamento, onde a geografia ou o local era importante para a prática da
adoração a Deus.
Deus, através de Jesus Cristo, derrubou altares
e templos para universalizar a adoração, e os crentes pretendem reconstruir
ambos para voltar aquilo que não mais existe.
Vivendo no contexto do Novo Testamento os
crentes devem repensar suas práticas de adoração, de modo que possam viver adorando a Deus em espírito e em verdade dentro do
metrô, do avião, no lazer, na escola, no trabalho, em casa, enquanto caminham
pela cidade ou pelo campo e também, e não somente, na igreja.
Afinal, um crente normal, uma pessoa que tem
ocupações comuns na vida e não aquela fanática que acha que ser crente é não
fazer mais nada a não ser ficar envolvido com sua religiosidade, ela somente
tem condições de ir a igreja um dia da semana, e nesse dia ficar no máximo duas
ou três horas dentro no templo, de modo que se sua adoração se limitar a igreja
o privilégio de adorar a Deus ficará reduzido a um tempo muito curto,
curtíssimo mesmo, de sua semana o que representa grande perda.
Afinal, adorar a Deus, diferentemente do que
se possa pensar, mais revitaliza o adorador do que propriamente o esgota.
Os verdadeiros adoradores, disse Jesus, não
adoram nem aqui, nem ali mas em espírito e
em verdade aqui e ali, porque são estes os
adoradores que o Pai procura para
seus adoradores (Jo 4.23) e não mais adoradores de lugares específicos.
São palavras do apóstolo Paulo: Porque a circuncisão somos nós, que adoramos
a Deus em espírito, e nos gloriamos em Jesus Cristo, e não confiamos na carne
(Fp 3.3).
Lutero Paiva Pereira